Uma nova edição de colecionador da Criterion Collection do último filme de Pier Paolo Pasolini, Salò, ou os 120 dias de Sodoma (Salò o le 120 giornate di Sodoma, Itália, 1975), um dos filmes mais assombrosos e traumatizantes de todos os tempos, censurado à época em quase todo o mundo, e ainda hoje banido na Austrália, sem mencionar os países muçulmanos, está a caminho. Em formato Letterbox, com subtítulos em inglês, a nova edição traz uma cópia recentemente restaurada, em transferência digital de alta definição.
Esta edição difere, em seus extras, das últimas edições do filme, lançadas pelo British Film Institute - BFI (2001) e pela Carlotta Films (2002), em formato Fullscreen, incluindo as duas versões do filme, a original e a francesa “oficial” (que cortou uma cena em que um dos fascistas lia um poema de Goethe); o documentário ‘Salò’ d’hier à aujourd’hui (32 minutos), com imagens de arquivo de Pasolini nas filmagens, entrevistas suas da época e depoimentos recentes de colaboradores; o documentário Enfants de Salò (20 minutos) com depoimentos de quatro cineastas franceses (Bertrand Bonello, Catherine Breillat, Claire Denis e Gaspard Noé) que se consideram fortemente influenciados por Salò; e um livreto com artigos e entrevistas de Pasolini. E difere também da edição G.C.T.H.V. (2002), única em formato Widescreen, e que inclui a coletânea de takes e stills de arquivo Pasolini au travail (13 minutos); e uma entrevista com o colaborador Jean-Claude Biette.
A nova edição Criterion falha ao não incluir as duas versões do filme, sem falar dos extras das edições européias. Mas apresenta um livreto com ensaios inéditos de Neil Bartlett, Roberto Chiesi, Naomi Greene, Gary Indiana e Sam Rohdie, e trechos dos diários que Gideon Bachmann escreveu durante as filmagens de Salò; e três documentários exclusivos: Fade to Black (15 minutos), um novo documentário sobre Salò, com depoimentos de Bernardo Bertolucci, Catherine Breillat e John Maybury; Yesterday and Today (35 minutos), com entrevistas de Pasolini à época das filmagens, do cenógrafo Dante Ferretti, do cineasta Jean-Pierre Gorin, dos colaboradores Jean-Claude Biette e Nineto Davoli; e The End of Salò (40 minutos), sobre a cena final do filme. Na primeira concepção de Pasolini, Salò terminaria com toda a equipe dançando no set, sem figurino de época, em suas roupas comuns, representando a si mesmos. A cena chegou a ser filmada, tendo sido registrada no making of realizado pelo jornalista alemão Giddeon Bachmann e retomada no documentário Pasolini: Prossimo Nostro (Itália, 2006), de Giuseppe Bertolucci, numa visita – invisível desde 1975 – ao set de Salò. Pasolini permitira àquele jornalista, que se tornara seu amigo, segui-lo com uma pequena câmara durante as filmagens, concedendo-lhe uma de suas últimas entrevistas sobre os horrores do consumismo, que ele retrataria no filme, sem esperança de que fosse entendido pelas novas gerações, imbecilizadas pelas mídias.
O longo depoimento de Pasolini a Gideon Bachman recuperado por Giuseppe Bertolucci é entremeado com os stills em preto-e-branco que a excelente fotógrafa inglesa Deborah Imogen Beer realizou com uma câmara protegida por um invólucro que tornava seus cliques silenciosos, permitindo-lhe trabalhar enquanto Pasolini dirigia os atores nas cenas mais horripilantes; e de tomadas de cenas perdidas no roubo dos negativos de Salò, como a seqüência do estupro e morte de uma mulher numa espécie de cadeira elétrica e a cena final do baile da equipe. Pasolini decidiu não incluir o baile ao finalizar Salò. Foi uma decisão acertada: a súbita invasão da realidade do set no universo altamente estilizado do filme, ainda que fosse uma idéia avançada (Fellini realizaria uma invasão análoga oito anos depois em E la nave va) atenuaria o impacto daquele imaginário infernal.
A edição dupla Criterion Collection de Salò, com lançamento previsto para 26 de agosto de 2008, pode ser encomendada na Amazon.
Luiz Nazario
Esta edição difere, em seus extras, das últimas edições do filme, lançadas pelo British Film Institute - BFI (2001) e pela Carlotta Films (2002), em formato Fullscreen, incluindo as duas versões do filme, a original e a francesa “oficial” (que cortou uma cena em que um dos fascistas lia um poema de Goethe); o documentário ‘Salò’ d’hier à aujourd’hui (32 minutos), com imagens de arquivo de Pasolini nas filmagens, entrevistas suas da época e depoimentos recentes de colaboradores; o documentário Enfants de Salò (20 minutos) com depoimentos de quatro cineastas franceses (Bertrand Bonello, Catherine Breillat, Claire Denis e Gaspard Noé) que se consideram fortemente influenciados por Salò; e um livreto com artigos e entrevistas de Pasolini. E difere também da edição G.C.T.H.V. (2002), única em formato Widescreen, e que inclui a coletânea de takes e stills de arquivo Pasolini au travail (13 minutos); e uma entrevista com o colaborador Jean-Claude Biette.
A nova edição Criterion falha ao não incluir as duas versões do filme, sem falar dos extras das edições européias. Mas apresenta um livreto com ensaios inéditos de Neil Bartlett, Roberto Chiesi, Naomi Greene, Gary Indiana e Sam Rohdie, e trechos dos diários que Gideon Bachmann escreveu durante as filmagens de Salò; e três documentários exclusivos: Fade to Black (15 minutos), um novo documentário sobre Salò, com depoimentos de Bernardo Bertolucci, Catherine Breillat e John Maybury; Yesterday and Today (35 minutos), com entrevistas de Pasolini à época das filmagens, do cenógrafo Dante Ferretti, do cineasta Jean-Pierre Gorin, dos colaboradores Jean-Claude Biette e Nineto Davoli; e The End of Salò (40 minutos), sobre a cena final do filme. Na primeira concepção de Pasolini, Salò terminaria com toda a equipe dançando no set, sem figurino de época, em suas roupas comuns, representando a si mesmos. A cena chegou a ser filmada, tendo sido registrada no making of realizado pelo jornalista alemão Giddeon Bachmann e retomada no documentário Pasolini: Prossimo Nostro (Itália, 2006), de Giuseppe Bertolucci, numa visita – invisível desde 1975 – ao set de Salò. Pasolini permitira àquele jornalista, que se tornara seu amigo, segui-lo com uma pequena câmara durante as filmagens, concedendo-lhe uma de suas últimas entrevistas sobre os horrores do consumismo, que ele retrataria no filme, sem esperança de que fosse entendido pelas novas gerações, imbecilizadas pelas mídias.
O longo depoimento de Pasolini a Gideon Bachman recuperado por Giuseppe Bertolucci é entremeado com os stills em preto-e-branco que a excelente fotógrafa inglesa Deborah Imogen Beer realizou com uma câmara protegida por um invólucro que tornava seus cliques silenciosos, permitindo-lhe trabalhar enquanto Pasolini dirigia os atores nas cenas mais horripilantes; e de tomadas de cenas perdidas no roubo dos negativos de Salò, como a seqüência do estupro e morte de uma mulher numa espécie de cadeira elétrica e a cena final do baile da equipe. Pasolini decidiu não incluir o baile ao finalizar Salò. Foi uma decisão acertada: a súbita invasão da realidade do set no universo altamente estilizado do filme, ainda que fosse uma idéia avançada (Fellini realizaria uma invasão análoga oito anos depois em E la nave va) atenuaria o impacto daquele imaginário infernal.
A edição dupla Criterion Collection de Salò, com lançamento previsto para 26 de agosto de 2008, pode ser encomendada na Amazon.
Luiz Nazario