Imagem de abertura de Kwaidan, anunciando sua ousada aventura visual.
Os olhos na noite do conto "A mulher da neve".
A Continental lançou no Brasil um filme raro, e que provavelmente poucos poderiam esperar: Kwaidan (1964), dirigido por Masaki Kobayashi, tendo ainda as contribuições de Yoshio Myiajima (cinematografia) e as magníficas, imponentes e enigmáticas composições/ruídos do grande Tôru Takemitsu. Dividido em quatro contos – adaptados do livro e do universo do escritor anglo-japonês Lafcadio Hearn –, os 161 minutos de filme são uma deslumbrante e ousada aventura visual, que compensa a fraqueza de pelo menos duas narrativas (a primeira e a última). A colorida e agressiva fotografia, que explode no céu noturno e invernal de dalineanos olhos multicoloridos pintados no cenário (que fazem parte da belíssima composição visual do segundo episódio), necessitavam de uma passagem correta do mundo intenso e amplo da película para o universo concentrado da imagem na televisão. Nesse sentido, a cópia distribuída pela Continental é muito correta: em formato widescreen, sem os erros de codificação – causados por uma miríade de causas, que vão de problemas de software e hardware à crônicos defeitos de prensagem – que são a praga de muitas distribuidoras independentes, e mesmo big players, no Brasil.
As legendas apresentam-se sem erros muito perceptíveis de gramática, embora seja difícil aferir questões relacionadas à tradução. Pelo que podemos ver, comparando o segundo e o terceiro contos com a fonte inspiradora (os contos "Yuki-Onna" e "The Story of Mimi-Nashi-Hoichi", disponíveis na versão online do livro Kwaidan, de Lafcadio Hearn), a tradução segue o fio condutor da narrativa sem muitos tropeços.
A falta de extras, contudo, é um dos pequenos defeitos da edição, largamente compensado pela preservação da qualidade do filme, pois mesmo a edição da Criterion, que a Continental parece ter usado como parâmetro, apresenta certa pobreza nesse campo. No mais, esperemos que outros longas de terror poético japonês, como Ugetsu, de Mizoguchi, recém lançado pela Criterion, tenham espaço por aqui também.
Alcebiades Diniz Miguel