sábado, janeiro 27, 2007

Justos homenageados cinematicamente na França


Numa França recentemente abalada por uma macabra sucessão de eventos anti-semitas, mas capaz de abrigar um Museu da Schoá antes de qualquer outro país da Europa, o Presidente Jacques Chirac – o primeiro presidente francês a reconhecer a participação do Estado francês no Holocausto, com as deportações de julho de 1942 no Vel’d’Hiv – homenageou a 18 de janeiro os seus Justos – homens e mulheres que salvaram judeus do extermínio, ou tentaram fazê-lo, sob o risco das próprias vidas. À cerimônia no Panthéon compareceram mais de 30.000 pessoas. Diante da enorme afluência do público, Renaud Donnedieu de Vabres, Ministro da Cultura e da Comunicação, prolongou a abertura gratuita do Panthéon, onde o público foi convidado a descobrir a inscrição em homenagem aos Justos da França na cripta do monumento; e a instalação especialmente criada para a ocasião pela cineasta Agnès Varda no coração do edifício. O trabalho de Agnès Varda é magnífico, afirmou o Le Monde (cuja nota saiu neste link), que assim o resumiu: centenas de fotografias foram colocadas, até mesmo no chão, ou postas como livros abertos – retratos de cerca dos 2.725 Justos da França recenseados pelo Memorial Yad Vashem (o número mais alto depois da Polônia e dos Países Baixos). No meio daqueles cujos nomes estão escritos, encontravam-se rostos não identificados representando os Justos desconhecidos. Culminando o majestoso platô circular, quatro telas gigantes difundiam a cada quinze minutos dois filmes de dez minutos. De qualquer ponto em que o visitante se encontrasse sempre podia ver duas das telas, um díptico que evocava a Ocupação alemã, com suas razzias, e as fugas, e os esconderijos das crianças ameaçadas. De um lado, uma versão em preto e branco, como um filme de época; do outro, a mesma versão em cores, mas não exatamente a mesma: Agnès Varda filmou duas vezes as mesmas cenas, mas mudando os ângulos; a versão colorida possuía inserts de imagens de troncos de árvore, de pedras gastas, de portas entreabertas; ora se via numa tela o rosto de um Justo, e na outra o rosto do ator que o encarnava. Varda trabalhou com imagens-chaves (suásticas, botas, estrelas amarelas, carimbos administrativos) e sons (cães, apitos, trem), privilegiando gestos (um padre assina um certificado de batismo) e lugares (caves, celeiros, fazendas) até o fim amargo que sugere que alguns Justos foram denunciados.

Luiz Nazario